22 de janeiro de 2010

Ventiladores asiáticos

Dão asas ao vento que já voa sem asas. Pronto, é isso.

Há algum tempo, fala-se de arte moderna. Procura-se beleza em objetos que, por tão destoantes, são estranhos vistos juntos. Entende-se por arte um monte de papel picado dentro de um museu, como os feitos por crianças no jardim de infância. A arte moderna chama a atenção de nós, irrecuperáveis desatentos, aos contornos óbvios da vida. Talvez ela sublinhe aos desavisados as mais belas palavras de suas vidas cotidianas.
Leia como se estivesse apreciando uma pintura: saboreando-a com os olhos, descobrindo o gosto exótico que o guache de palavras proporciona. Leia como se estivesse apreciando uma música: tocando-a com os tímpanos, compreendendo a melodia lúdica nas entrelinhas. Não deixe, porém, que esta seja a maior arte do seu dia. Os maiores prazeres não estão na arte moderna, nem em qualquer outra. Afinal, queridas crianças no jardim de infância, “Aprecie com moderação” é só para os adultos.

15 de janeiro de 2010

Dos vinte e dois ao sentido perdido

Despertador. Seis horas. Olhos preguiçosos. Só mais um pouquinho. Cansaço. Levanta. Chinelos. Que dia é hoje mesmo? Oito passos. Chuveiro. Abre a torneira. Quarta-feira. Sabão. Tenho que pagar a conta de luz. Bucha. Espero que o fim de semana chegue logo. Enxágua. Acho que vou ver o filme novo do Woody Alen. Shampoo e Condicionador. 2 em 1. A Crítica diz que é bom. Fecha a torneira. Toalha. Desodorante. Perfume. Dez escovadas no cabelo. Doze nos dentes. Espelho sorridente. Galã de novela. Quatorze minutos. De volta ao quarto. Cuecas. Calça. Meias. Sapato. Maria, engraxa pra mim? Camisa. Pois não, doutor. Gravata. Que nó estranho! Cozinha. Café, torradas e jornal. Ah, esse meu país... Tá aqui o sapato, doutor. Obrigado, Maria. Dezesseis minutos. Tudo acaba em pizza. Paletó, celular e carteira. Chaves. Porta. Cuide-se, Maria! Elevador. Será que a avenida vai estar engarrafada hoje? Chave do carro na mão. Botão: Garagem. Batuque ansioso. Surpresa. Palma. Não peguei o maldito! Mosquito. Chave na ignição. Carrão. Nunca me deixou na mão! Embreagem, primeira, acelerador. Rampa. Botão. Portão abre. Botão. Portão fecha. Rua. Vinte quilômetros por hora. Aglomeração à vista. Que será isso? Para. Sai. Que aconteceu? Uma bicicleta e um carro. Amassou a lataria. Amassou a bicicleta. Bicicleta órfã. Apenas vinte e dois anos.