8 de outubro de 2011

Das inspirações

O trompete de Miles Davis. O gole de uísque macio por uma prévia água gelada. O bom samba, gentilmente nostálgico, salgado com lágrimas à gosto. A cerveja encorpada, cremosa e frutada, que faz cócegas no fundo da boca. O sexo, drogas e rock and roll até tarde da noite. O som silenciador da vitrola. O chocolate quente no frio de montanha. O sussurro do mar no fim da madrugada, quebrando nas pedras. A água de coco no calor de quarenta. O primeiro atrito da massa al dente com os dentes. O cheiro de terra molhada de chuva. A pimenta que não arde demais nem de menos. O café preto da tarde. O pão francês com mortadela. O bolo saindo do forno, com perfume percorrendo a casa toda, como em desenho animado. O frango assado de padaria.

A alegre e atabalhoada falta de escrúpulos de seu cachorro ao te ver. A moleza independente e pidona do seu gato manhoso. A amizade – só a verdadeira – e sua inerente sinceridade. O ombro amigo. O abraço do avô. O bobó de camarão da avó. As mãos protetoras do pai. Os carinhos eternamente pacientes da mãe. O sapato de passos familiares no corredor. O primeiro luar. O olhar que paquera entre cegos. O beijo que mata a sede. A vontade insolúvel que quase enlouquece. A maciez pueril do encontro das bochechas de um só amor, deitados na cama. O aroma da pele de quem se ama. O sonho bom. O aconchego exasperado daquele sono fugaz quinze minutinhos atrasado após o despertador.

O petardo que estufa as redes. A força transgressora que ultrapassa a lei injusta. A cesta de chuá no último segundo. A luta do imoral contra a amoralidade que o cerca. A oração intempestiva, mas que não falha. A bola do jogo que cai na linha. O milagre da fé revestido na paixão camaleoa – da alegria à tristeza – por uma religião, um time, um partido, enfim, uma crença convicta, conjunta e utópica. As utopias. Ah, as utopias... A liberdade. O sentido da vida. Viver mais do que este sentido te traz; por tudo que sentes e por tudo que não sabes. Sempre fazer mais do que já foi feito. E poder sonhar com o brilho nos olhos de uma criança imediatamente antes e imediatamente depois de abrir um presente. Um, pela esperança corajosa enfrentando todas as incertezas, e o outro, pela surpresa certa e expansiva, da mais pura felicidade. Mais? Uma boa leitura.

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